27 outubro 2017

Angola, 1967 - Marinha no rio Cuando, Parte II


Fuzileiros e Reserva Naval no rio Cuando - Angola, 1967

(Post reformulado a partir de outro já publicado em 12 de Setembro de 2010)


Brindado com uma comissão de dois anos na Guiné nunca pisei solo angolano, nem como oficial da Marinha de Guerra, ao tempo da Reserva Naval, nem tão pouco como cidadão português, seja na perspectiva anterior seja na posterior ao final da Guerra do Ultramar, após a independência daquele território.

Por mera analogia com Moçambique, partilho pacificamente e dialogo abertamente sobre estes temas, ouvindo opiniões multifacetadas de camaradas, amigos e até familiares que ali se radicaram temporária ou definitivamente, quer como militares no cumprimento de missões quer como simples cidadãos.




Missão Católica de Santa Cruz do Cuando – Da esquerda para a direita:
CFR Raul Sousa Machado, 2TEN FZ RN Frederico da Luz Rebelo
e CMG Fernando da Silva Soares Branco (Segundo-Comandante Naval de Angola).


Não consigo rabiscar letras e muito menos escrever páginas, sobre temas que, nas memórias gravadas no meu espírito, escapam ao meu sentir e conhecimento. Representará sempre uma fasquia de honestidade limite que nunca estarei disposto a transpor, caindo no outro lado.




Missão Católica de Santa Cruz do Cuando – Da esquerda para a direita, o CFR Armando António Pimentel Saraiva - CEM do Comando Naval de Angola, o 2TEN FZ RN Frederico da Luz Rebelo e o CFR Raul Sousa Machado.

Contudo, considero estar em condições de afirmar que escrever ou relatar com verdade pesquisada e documentada, optando pelo rigor histórico em detrimento de algum rápido sucesso literário, é tarefa penosa com custos pessoais pesados, no tempo e meios empenhados.

Em alguns dos temas que abordo, procuro compensar a ausência de episódios e vivências havidas com conhecimento adquirido, lendo alguma coisa e pesquisando muito, tentando chegar a algum valor acrescentado nos episódios e relatos dispersos que submeto à paciência dos leitores que me acompanham.




Duas imagens do transporte da LDP 105 para o Chicove.



Angola e o rio Cuando, no sudeste, não obrigam ninguém a dissertar sobre Bosquímanos, Bantos ou qualquer outra etnia. Para mim, a memória resvalaria inevitavelmente para “Os Deuses Devem Estar Loucos”, 1980, de Jamie Uys e a história do “Xi atrás da coisa – a garrafa de Coca-Cola”.

Tive vários camaradas da Reserva Naval que foram chamados a desempenhar missões naqueles locais remotos, por muitos apelidados de “cus de judas” e quase, se não mesmo, exclusivamente da classe de Fuzileiros.

Não sei de forma exaustiva quem por lá passou, nem para isso vou ter tempo. Tão pouco vou ter sequer a pretensão de fazer disso um objectivo pendente. Há um ror de camaradas, felizmente muitos deles ainda entre nós, dos vários Ramos das Forças Armadas que ali permaneceram ainda que pontualmente.

Mais do que ninguém, têm condições privilegiadas para registar memórias de acontecimentos havidos, parte de um legado histórico que se vai perdendo nos testemunhos desaparecidos pela mão da inexorável gadanha que a todos vai tolhendo a prazo.

Não significa também que aqui não deixe relatos ou testemunhos parciais, simples retalhos, para que alguém ou outros possam encontrar algumas pistas para o conhecimento acrescentado e dinâmico que se deseja na “História”.

Referindo apenas o meu curso, o 8.º CEORN – Curso Especial de Oficiais da Reserva Naval, foram para Angola integrados na Companhia de Fuzileiros n.º 1 (1966/1968), os 2TEN FZ RN Rui Camargo de Sousa Eiró (falecido), 2TEN MN RN Frederico Aníbal Saldanha da Silveira Machado, 2TEN FN RN António Luis Marinho de Castro (falecido) e o 2TEN FZ RN Joaquim José de Carvalho.

Integrados na Companhia de Fuzileiros n.º 11 (1966/1969), foram também os 2TEN FZ RN Luis Domingos Costa Azevedo Vaquinhas, 2TEN FZ RN Frederico da Luz Rebelo (falecido) – o oficial que aparece no filme do rio Cuando - , 2TEN FZ RN Manuel José Gomes dos Santos Pereira e o 2TEN MN RN João Carlos Cabral Nunes Correia.

O primeiro comando da LDP 210 naquela zona e respectiva guarnição, depois de um transporte de antologia efectuado sob a égide da RMA – Região Militar de Angola, foi do 2TEN RN António Luis Marinho de Castro, epopeia que lhe valeu um louvor e medalha.




O 2TEN FZ RN Luis Marinho de Castro e a LDP 210.

Naturalmente que as rendições se foram sucedendo ao longo do tempo. Muitas guarnições de lanchas e oficiais de outras Companhias terão ali desempenhado missões de 1966 a 1975, naquela ou noutra unidade naval, sempre LDP, que para aquela zona tenha sido transportada.



A LDP 208 em patrulha no rio Zambeze.

De meu conhecimento documental, estiveram também no leste de Angola a LDP 208, na margem esquerda do Zambeze (Chilombo) e a LDP 105, mais conhecida como o “Expresso do Chicove”, no Rivungo.




Em cima, outra imagem do transporte da LDP 105 e, em baixo, pessoal em serviço no Chicove.



A lancha terá sido transportada por navio até Moçâmedes, seguindo depois de comboio até Serpa Pinto. Daí, numa distância de cerca de 600 Km e por picadas arenosas, seguiu em coluna militar até ao seu destino, o Rivungo, no rio Cuando (fronteira com a Zâmbia).

Apenas com contributos dinâmicos, consubstanciados em testemunhos e relatos de quem lá tenha estado ou investigadores interessados, se poderá ir dando corpo a uma história incompreensivelmente esquecida em baús de recordações ou arquivos de acesso muito limitado.




A LDP 105 (Expresso do Chicove) amarrada à LDP 210.



Abaixo se transcreve o comentário do leitor Egidio Cardoso - CCAÇ 3441 efectuado ao post anterior e lá publicado:


“Na verdade e tanto quanto sei, a Marinha no Cuando, estava representada por dois destacamentos, cada um com uma LDP (sendo uma a LDP 210), transportadas por estrada, desmontadas, em cima de viaturas: uma delas, como refere, no Chicove, a norte de Neriquinha. A outra, a que não faz referência, a sul da Neriquinha, mais exactamente no Rivungo (Destacamento de Marinha do Rivungo) local onde existia um destacamento com um pelotão da companhia de caçadores estacionada na Neriquinha.

Veja o nosso blog, especificamente o post:



E.C.”



Bem vindo na visita, tanto pelo comentário como pelo endereço do blogue que publico. Permite uma breve sortida ao passado recente da História Marinha em Angola - Rivungo mostrando que na LDP 210, nos confins do mundo, também se perdeu a vida em combate.

Depois de atenta leitura considero um dever pessoal honrar a memória de quem ali, ao serviço da Marinha de Guerra e do País, perdeu a vida em combate, identificando quem foi quem, e deixando pistas para ulteriores pesquisa do tema a quem pretenda.


“O 1GR FZ 2862/69 Celestino Mesquita de Carvalho, integrando a guarnição da LDM 210, em Angola, no dia 8 de Abril de 1972, morreu em combate quando aquela unidade naval se encontrava a patrulhar o rio Cuando e foi atacada pelo inimigo. A praça em questão foi atingida com várias rajadas de metralhadora que lhe provocaram a morte, tendo caído à água. O corpo nunca foi encontrado.”


Para que nunca sejam esquecidos!




Fontes:
Anuário da Reserva Naval 1958-1975, Adelino Rodrigues da Costa e Manuel Pinto Machado, Lisboa, 1992; Fuzileiros-Factos e Feitos na Guerra de África, 1961/1974, Angola, Luis Sanches de Baêna, Comissão Cultural de Marinha, 2006; Texto e fotos de arquivo do autor com amável cedência do 1TEN AN Ref Raul Sousa Machado; Arquivo da Marinha;


mls

24 outubro 2017

Angola, 1967 - Marinha no rio Cuando, Parte I


Fuzileiros e Reserva Naval no rio Cuando - Angola, 1967

(Post reformulado a partir de outro já publicado em 4 de Setembro de 2009)


Em meados de 1967, pela agressividade crescente do terrorismo no leste de Angola, houve natural necessidade de reforçar o dispositivo naval naquele frente do território. Para tal, foram deslocados pelo Comando Naval de Angola para a Zona Militar Leste dois Destacamentos de Fuzileiros Especiais.

Ficou um sedeado no Chilombo, o DFE 2, na margem esquerda do rio Zambeze, com a LDP 208, armada, e outro, o DFE 11, na margem direita do rio Lungué-Bungo, junto à ponte da picada Lucusse-Luvuei, articulando-se um comando móvel e comunicações com a Zona Militar Leste, no Luzo.

Estacionada naquele teatro, a Companhia de Fuzileiros n.º 1 já tinha regressado a Luanda às INIC, deixando o rio Zaire, mantendo um pelotão destacado no rio Cuando, integrando o designado Destacmarcuando com a missão de patrulhar aquele rio e margens, disponibilizando pessoal para guarnecer a LDP 210 que, desde 29 de Junho, a Marinha manteve a navegar naquele rio.

Trajecto da LDP 210 de Luanda ao rio Cuando,
1800 Km por estrada - Maio de 1967



A LDP 210, foi uma das muitas lanchas que, num esforço hercúleo, a Marinha colocou no coração de África. Viajando a partir da costa ao longo de um percurso terrestre de 1800 km em cima de uma viatura-plataforma integrada numa coluna da Região Militar de Angola (RMA), saiu de Luanda e, passando por Salazar, Malanje, Nova Gaia, Quitapa, Xassegue, Cacolo, Lizo, Lutamba, Lucusse, Gago Coutinho, Ninda e Chiume, chegou ao rio Cuando.



Em cima o lançamento da LDP 210 e, em baixo, já a navegar.



Foi lançada em Chicove, a 9 km de Chiume, a montante de Neriquinha sofrendo o primeiro ataque logo no dia seguinte.

É da LDP 210 que se inclui o filme reportagem seguinte, provavelmente rodado em 1967 ou 1968. Apesar das dificuldades e ausência de informação é possível identificar o 2TEN RN Frederico da Luz Rebelo, oficial da Reserva Naval do 8.º CEORN e que comandava a força transportada na lancha.



O 2TEN FZ RN Frederico da Luz Rebelo

Aquele oficial foi para Angola integrado na Companhia de Fuzileiros n.º 11 (1966/1969), comandada pelo 1TEN Carlos José Saldanha Mota dos Santos, tendo como imediato o 2TEN José Alberto de Milharadas Pedro e o 2TEN Carlos Alberto Mano Simões Lopes.

Pertenceram ainda aquela unidade os 2TEN FZ RN Luis Domingos Costa Azevedo Vaquinhas, 2TEN FZ RN Manuel José Gomes dos Santos Pereira e o 2TEN MN RN João Carlos Cabral Nunes Correia todos do 8.º CEORN - Reserva Naval




Locução de Júlio Isidro.

(continua)



Fontes:
Cópia de filme gentilmente cedida pela Escola de Fuzileiros, a partir de película rodada, ao tempo, com a colaboração da Marinha; Fuzileiros-Factos e Feitos na Guerra de África, 1961/1974, Angola, Luis Sanches de Baêna, Comissão Cultural de Marinha, 2006; Texto e fotos de arquivo do autor;


mls

07 outubro 2017

Angola, anos 60/70 – Os Fuzileiros no rio Zaire, Parte II


Angola - Os Fuzileiros no rio Zaire

(Post reformulado a partir de outro já publicado em 9 de Outubro de 2010)




Angola, rio Zaire - Duas imagens da LFP "Pollux" em fiscalização e patrulha




O pequeno trecho filmado do final desta publicação foi rodado em Angola. A LFP «Pollux» navega no rio Zaire, provavelmente no final dos anos '60 e documenta a importância que o dispositivo naval da Marinha - Unidades Navais e Fuzileiros – tinha na fiscalização e vigilância daquele curso de água.

Transportes de pessoal, abastecimentos e outras cargas faziam parte das rotinas das guarnições de Unidades Navais e Destacamentos ou Companhias de Fuzileiros, garantindo a segurança de pessoas e bens transportados.

Com base em SAZAIRE – Comando de Defesa Marítima de Santo António do Zaire, onde existia uma Esquadrilha de Lanchas com unidades navais atribuídas, eram lançadas operações quer de simples fiscalização e patrulha quer actuando em conjunto com forças de Fuzileiros.

A partir de postos onde estavam sedeados ao longo do curso do Zaire, por exemplo a lendária “Pedra do Feitiço”, embarcados em LDM ou utilizando meios próprios, os botes, complementavam e apoiavam também a acção das unidades navais.

As “muilas” e os “bordoeiros” ainda hoje povoam as memórias históricas de militares que ali desempenharam missões ou populações que ali estiveram estabelecidas.

A unidade naval que participou no documento filmado, a LFP «Pollux» – P 368, foi uma Lancha de Fiscalização Pequena, cujo comando foi sempre efectuado por oficiais da Reserva Naval.






Fontes:
Texto e foto de arquivo do autor do blogue; cópia de filme gentilmente cedida pela Escola de Fuzileiros, a partir de película rodada, ao tempo, com a colaboração da Marinha;


mls

04 outubro 2017

Guine 1970, DFE 21 (Parte II) - Destacamento de Fuzileiros Especiais Africanos e Reserva Naval


DFE 21 - O primeiro Destacamento de Fuzileiros Especiais da «Série 20»

(Post reformulado a partir de outro já publicado em 28 de Maio de 2010)

Parte II

Operação "Mar Verde"




DFE 21 - Uma breve pausa na progressão é aproveitada para descanso





O recrutamento inicial de elementos para integrar o DFE 21 já tinha sido iniciado em Setembro de 1969. Depois de activado, em 21 de Abril de 1970, participou, até Maio, em diversas operações no sul da Guiné depois do que, conjuntamente com o DFE8, passou a estar sedeado em Vila Cacheu.

Naquelas zonas efectuou várias acções, tendo sofrido pesadas baixas entre mortos e feridos, entre os quais se incluíram alguns oficiais e sargentos. Em Agosto, depois de uma curta passagem por Buba, foi transferido para Brá, para se juntar aos preparativos que antecederam a organização da operação “Mar Verde”, já em curso na ilha de Soga e na qual viria a participar.




A sudoeste do canal do Geba, no arquipélago dos Bijagós,
a ilha de Soga, base de preparação da operação "Mar Verde".
Situada a oeste da ilha de Rubane, estão ambas encaixadas entre os canais Diogo Gomes e Bubaque


A ilha de Soga foi escolhida como local de preparação pelas condições especiais que detinha, a par de uma situação estrategicamente recatada que oferecia a possível segurança em termos do necessário secretismo. A operação, quer na planificação prévia quer na organização e execução finais, teve como estratega e Comandante o CTEN Alpoim Calvão (OTC).

O DFE 21, na estrutura inicial, teve como Comandante o 1TEN FZE Raul Eugénio Dias da Cunha e Silva que tinha ingressado nos Quadros Permanentes, na classe de Fuzileiros, depois de ter efectuado uma primeira comissão de serviço na Guiné, como terceiro oficial do DFE 4, de 1965 a 1967. Pertenceu originalmente à Reserva Naval onde integrou o 7.º CEORN.

Em 21 Junho de 1971 o comando do Destacamento de Fuzileiros Africanos, DFE 21, foi sendo parcial e progressivamente rendido, ainda que alguns dos elementos que o constituiam continuassem voluntariamente até 1 de Abril de 1973.

Foi nomeado Comandante do DFE 21 o 1TEN FZE José Manuel de Matos Moniz, também ele originário da Reserva Naval. Tinha pertencido ao 8.º CEORN e, no final do curso foi integrado no DFE 1, em Moçambique e de 1967 a 1969, depois do que concorreu aos Quadros Permanentes na classe de Fuzileiros.

Comandantes:

1TEN FZE Raul Eugénio Dias da Cunha e Silva, 7.º CEORN, ingressou nos QP;
1TEN FZE José Manuel de Matos Moniz, 8.º CEORN, ingressou nos QP;

Oficiais Imediatos:

1TEN José Maria da Silva Horta, QP;
2TEN Luis António Proença Maia, QP;
2TEN FZE RN António José Rodrigues da Hora, 11.º CFORN, ingressou nos QP;
2TEN FZE RN Manuel Maria Peralta de Castro Centeno, 19.º CFORN, ingressou nos QP;

Oficiais:

2TEN FZE José Carlos Freire Falcão Lucas, 13.º CFORN;
2TEN FZE RN Eduardo Madureira da Veiga Rica, 14.º CFORN*;
2TEN FZE Manuel José Fernandes Guerra, 15.º CFORN;
2TEN FZE RN Jaime Manuel Gamboa de Melo Cabral, 16.º CFORN;
2TEN FZE RN Francisco Luis Saraiva de Vasconcelos, 16.º CFORN;
2TEN FZE RN João Frederico Saldanha Carvalho e Meneses, 19.º CFORN;
2TEN FZE RN Cândido Alexandre Lucas, 20.º CFORN;
2TEN FZE RN José Joaquim Caldeira Marques Monteiro de Macedo, 21.º CFORN;

* Meses depois, já na Guiné, sofreu um acidente em serviço tendo de ser evacuado.




DFE 21 - A evacuação de um ferido

Consideradas as guarnições dos navios que a integraram, a força que partiu da ilha de Soga em 20 de Novembro de 1970, totalizou próximo de 600 elementos. Foram 80 homens do DFE 21 que, com mais cerca de 200 homens pertencentes à “Front Nacional de Liberation de la Guiné” (FNLG) e 150 elementos da Companhia de Comandos Africanos comandada pelo Capitão João Bacar, iniciaram a operação “Mar Verde”.

Com o reforço de aviões P2V5 da Força Aérea Portuguesa, foram transportados e apoiados por uma força naval constituída por seis unidades navais.

Delas se indicam os respectivos Comandantes e Oficiais Imediatos, a saber:

LFG «Orion» (OTC) - CTEN Alberto Augusto Faria dos Santos e 2TEN Mário Manuel da Fonseca Alvarenga Rua, QP; nela embarcou o CTEN Alpoim Calvão, Comandante da operação;

LFG «Cassiopeia» – 1TEN Fausto José do Lago Domingues e 2TEN RN Alfredo Manuel de Paiva Pacheco, 13.º CFORN;

LFG «Dragão» – 1TEN António Alexandre Welti Duque de Martinho e 2TEN RN João Manuel Nunes Vaz, 13.º CFORN;

LFG «Hidra» – 1TEN José Augusto Fialho Góis e 2TEN Duarte José Cruz de Castro Centeno, QP;

LDG «Montante» – 1TEN Luis Manuel Dias da Costa Correia e 2TEN Raul David Nunes Vieira Pita, QP;

LDG «Bombarda» – 1TEN Arnaldo dos Santos Aguiar de Jesus e 2TEN RN Luis Manuel Ferreira Marques, 13.º CFORN;




Da esquerda para a direita, em Bissau: Alfredo Paiva Pacheco, Imediato da LFG «Hidra»;
João Manuel Nunes Vaz, Imediato da LFG «Sagitário», 1º TEN Arnaldo dos Santos Aguiar de Jesus, Comandante da LDG «Bombarda», José Guerreiro Banza, Comandante da LFP «Arcturus», Coutinho, Capelão Delmar Barreiros, CDMG e mais dois oficiais não identificados


Mais do que quaisquer outros considerandos estratégicos, militares, políticos e sociais que possam ter sido, ou vierem a ser invocados e memorizados em futuros considerandos filosóficos, ficou certamente para a História a libertação “concreta” de 25 militares, prisioneiros de guerra, e ainda um civil, resultado positivo inquestionável, justificativo de quaisquer decisões políticas e militares tomadas.

Nada mais valeroso e nobre do que uma missão cumprida, culminada pela libertação de reféns de guerra, devolvendo-lhes a dignidade de Homens e Combatentes ao serviço do país por que se bateram, restituindo-os à família e reconquistando-lhes a auto-estima, ambas perdidas no tempo de reclusão.

Com cunho meramente pessoal, aqui deixo exarado o meu apreço especial pela acção do DFE 21, cuja missão principal foi o ataque à prisão “La Montaigne” que levou a cabo com êxito total, não sem que deixe de ser importante tornar o apreço extensivo a todo o Comando da operação "Mar Verde", envolvendo todas as forças participantes, sem as quais não seria possível tal desfecho.

Noutra perspectiva social e política que rejeito, acompanhada de duvidosos e falaciosos argumentários, terá sido considerada como uma controversa e arriscada operação, também por nela terem sido envolvidos a quase plenitude dos meios da Marinha já empenhados num cenário guerra então mantido.

Para lá daquele assinalável resultado o grupo de assalto do 2TEN FZE RN Rebordão de Brito - grupo "Victor", com apenas 14 fuzileiros especiais e um guia, procedeu à neutralização da Marinha de Guerra do PAIGC (três vedetas e uma lancha de desembarque) e quatro lanchas torpedeiras da República da Guiné, todas acostadas no dique "La Prudence". Depois de eliminada a sentinela foram lançadas granadas para o interior das unidades navais, causando danos irreparáveis. Três delas afundaram-se de imediato e quatro incendiaram-se. Na breve escaramuça havida as nossas forças sofreram apenas um ferido ligeiro tendo provocado 24 baixas e retirado de seguida.

Melhor que quaisquer palavras, a foto abaixo ilustra um momento histórico pleno de significado. Um grupo de recém-libertados prisioneiros, depois do regresso à ilha de Soga, já em franca confraternização com a guarnição da LFG «Dragão» é fotografado na proa daquela lancha.



Desempenhava as funções de oficial Imediato da LFG «Dragão» o 2TEN RN João Manuel Vaz do 13.º CFORN. Sendo-o na realidade da LFG «Sagitário», uma imobilização prolongada desta lancha de fiscalização, muito sentido de responsabilidade assumida e camaradagem demonstradas, permitiram ao companheiro da LFG «Dragão» cumprir outros deveres na Metrópole.

De entre os prisioneiros libertados, o 2TEN João Manuel Vaz convidou um ex-prisioneiro, casualmente oficial, para com ele partilhar o jantar na LFG «Dragão». Algumas dificuldades na roupa que trazia vestida - uns parcos “slips” - criaram engulhos, rapidamente resolvidos pelo anfitrião que colocou a câmara de oficiais e alguma roupa pessoal à disposição do visitante.

A escolha incluiu uns calções e uma camisa, mas não permitiu ter em conta nem os efeitos do tempo de prisão visíveis no primeiro, nem a diferença de corpulência relativamente ao João Manuel Vaz, facto que acabou por se tornar chocantemente evidente depois de concretizada a improvisada adaptação de vestuário.

Nenhum número de roupagem resiste a regimes de clausura prolongadas com condições de privação tão humilhantes mas, quer a confrangente visão de uma camisa chegar aos joelhos quer um corpo inteiro caber numa pernas de uns calções, foram igualmente ultrapassadas sem constrangimentos.

Já à mesa, durante o jantar - um habitual peixe frito com arroz de tomate e salada - era evidente o nervosismo do convidado. Num expontâneo diálogo entabulado, quedaram também sem significado algumas dramáticas dificuldades do ex-prisioneiro na forma de lidar com garfo e faca, dando rapidamente lugar a outra forma prática de tomar uma refeição.

Opto pela dispensa de comentários ao que é por demais visível no nível de empenhamento e participação então exigido às guarnições de Destacamentos ou Companhias de Fuzileiros e Unidades Navais, onde os oficiais da Reserva Naval ombrearam com os seus pares dos Quadros Permanentes ao longo de 12 anos de guerra.

DFE 21 e operação "Mar Verde", podem ser tidos apenas como mais dois tão demonstrativos quanto eloquentes exemplos. Alguns dos participantes naquela epopeia já não se encontram entre nós, mas aqui fica a evocação que os mantém presentes no nosso espírito e memória.



(final)



Fontes:
Texto compilado com a colaboração de 2TEN RN João Manuel Nunes Vaz do 13.º CFORN; Arquivo de Marinha; Operação "Mar Verde" de António Luis Marinho - Temas e Debates, 2006; Fuzileiros - Factos e Feitos na Guerra de África - Guiné de Luis Sanches Baêna, 2006; Texto e fotos de arquivo do autor;


mls