09 fevereiro 2019

NRP «Quanza» - Um navio Reserva Naval


(Post reformulado a partir de outro já publicado em 17 de Fevereiro de 2017)

Navios Reserva Naval - Cuanza, Quanza ou Kuanza?




O navio-patrulha «Quanza» navega em pleno mar


Na continuação da publicação anterior sobre os navios-patrulhas da classe «Cacine», que se perfilaram como um dos tipos de navios cuja história se ligou de forma mais estreita à História da Reserva Naval, abordamos hoje o irmão gémeo navio-patrulha «Quanza», da mesma classe e o quinto na ordem cronológica a ser contruído nos Estaleiros Navais do Mondego, na Figueira da Foz. Foi aumentado ao efectivo dos navios da Armada e entregue a um representante do CEMA em 04Jun70

Mas por que motivo o navio-patrulha «Quanza» alterou o nome de baptismo para «Cuanza»?

Não sendo letrado na grafia na língua portuguesa, recordo a palavra «Quanza», com esta forma de escrita, na minha nebulosa memória da Geografia que foi me ministrada no Liceu Normal Pedro Nunes, tipo veneno a ingerir obrigatoriamente no intervalo das outras disciplinas que verdadeiramente me apaixonaram. As referências feitas à então Província de Angola, em termos de qualidade e conhecimento substantivo, eram basto escassas e nada propiciadoras de competitividade à altura das concorrentes da minha preferência, a Matemática, Física e Desenho.




O navio-patrulha «Quanza» evolui próximo da costa

No final do 8.º CEORN – Curso Especial de Oficiais da Reserva Naval não me coube na lotaria o prémio de ser destacado para Angola, nem tão pouco para Moçambique, porque foi entendido pela hierarquia institucional ser mais útil na Guiné, pese embora a nota de mérito por mim conseguida, justificasse a atribuição de outro lugar no respeito pela escolha dos candidatos, função das médias obtidas no final do curso. Mas, tal como hoje, novidades, novidades, só mesmo no Continente e a meritocracia continua a ser um conceito Einsteiniano. Pleno de relatividade...

Assim, não me foi dada o oportunidade de conhecer aquele território, contactar com a população e todo o valor acrescentado que dois anos de permanência poderiam significar culturalmente. Aprendi que apenas com estudo, pesquisa e consulta se consegue adquirir algum conhecimento sobre áreas e temas que desconhecemos. Nem me atrevo a dizer profundo, porque esse nível será antes um estado de espírito e nunca uma meta atingida.

O rio Kwanza – respeitando o nome oficial - é o maior rio exclusivamente angolano. Nasce em Mumbué, município do Chitembo, Bié, no Planalto Central de Angola. Tem um curso de 960 km desenha uma grande curva para norte e para oeste, antes de desaguar no Oceano Atlântico, na Barra do Kwanza, 50 km a sul de Luanda. Com uma bacia hidrográfica navegável por 258 km desde a foz até ao Dondo, as barragens de Cambambe e de Capanda produzem grande parte da energia eléctrica consumida em Luanda.




O navio-patrulha "Quanza" em exercícios conjuntos no mar

As barragens também fornecem água para irrigação de plantações de cana-de-açúcar e outras culturas no vale do Kwanza. É no maior afluente do Kwanza, o rio Lucala, que se encontram as grandes Quedas de Kalandula, anteriormente designadas Quedas do Duque de Bragança. Junto da foz do rio fica o Parque Nacional da Quiçama.

O rio Kwanza foi o berço do antigo Reino do Ndongo, tendo também sido uma das vias de penetração dos portugueses em Angola no século XVI. Dá o nome a duas províncias de Angola, Kwanza Norte, na margem norte, e Kwanza Sul, na margem oposta.

Em 1977, talvez porque a maioria das etnias angolanas são de origem "bantu" (ou banto) e começaram por se radicar inicialmente na região cuanza-norte, deu o nome à unidade monetária nacional, o «kwanza».

Mesmo a própria história da nossa Marinha Mercante confirma a existência de um NM «Quanza» que, em 5 de Outubro de 1929 foi entregue à Companhia Nacional de Navegação. Foi o primeiro paquete português a efectuar uma viagem aos Estados Unidos e à América Central, em 8 de Agosto de 1940 e fretado pela agência de navegação Pinto Basto.




Navio-Motor «Quanza»

Após anos de navegação com inúmeras viagens realizadas e transportes de tropa efectuados, na sua última viagem a Angola, deixou Lisboa em 17 de Maio de 1968, regressando com tropas, ao Tejo, em 23 de Junho. Após alguns meses no Mar da Palha foi adquirido por sucateiros espanhóis e, em 3 de Dezembro, foi rebocado para Bilbau para desmantelamento.

Voltando ao navio-patrulha «Cuanza», no respeito pela forma como actualmente o nome daquele navio-patrulha, questionar-se-á pertinentemente porque não «Quanza» ou, sob outra perspectiva, como e em que data foi alterado o nome daquele navio-patrulha?






Abaixo se transcreve na íntegra a nota do então CMG Lima Bacelar publicada na página 99 do 10.º Volume de “Setenta e Cinco Anos no Mar – Navios-patrulhas da classe Cacine”, 1999, Comissão Cultural da Marinha, relativamente ao nome do navio-patrulha:

“...Os equívocos ortográficos na denominação do 5.º patrulha da classe «Cacine» emergem ainda antes da sua entrega oficial à Marinha. Como imediato indigitado da primeira guarnição, poderei testemunhar que, na fase terminal de construção, chegaram a ser colocadas nas asas da ponte as placas identificativas com o nome «CUANZA», tendo presenciado as circunstâncias que levaram à modificação daquela ortografia para «QUANZA».
Em consequência, procurou-se certificar que a portaria de aumento ao efectivo do navio seguisse o mesmo critério ortográfico, o que veio a acontecer, ficando pois «QUANZA».
Essas iniciativas não evitaram que os organismos abastecedores viessem a fornecer diverso material para o navio com as duas ortografias.
Deste facto resultou que o nome do navio aparecesse escrito de forma diferente, designadamente, nas asas da ponte, no sino, nas sanefas da prancha e da ponte alta, nas fitas dos bonés das praças, nos carimbos, nos documentos recebidos a bordo, etc.. Não obstante e pelo que ficou expresso, julgo poder afirmar que a posição oficial assumida foi a de atribuir o nome «QUANZA» ao 5.º navio da classe «Cacine».
(in “Setenta e cinco anos no mar (1910-1985), ed. Comissão Cultural da Marinha)
Ficou com a seguinte identificação:
Nome - «QUANZA»
Indicativo de chamada internacional – CTPS
Indicativo de chamada visual – P 1144
Indicativo de chamada radiotelegráfico – PAANZA
Endereço radiotelegráfico – PAANZA
Por portaria nº 277/70, publicada na I Série do D. G. n.º 132 de 8JUN e na O. A. n.º 30 de 9JUN, cujo texto é o seguinte:
“Manda o Governo da República Portuguesa, pelo Ministro da Marinha, aumentar ao efectivo dos navios da Armada na situação de armamento normal, a partir de 4 de Junho de 1970, o navio-patrulha «Quanza», o qual ficará a pertencer à classe «Cacine»”..."






O navio-patrulha «Cuanza» largou para a primeira comissão no Ultramar, em Cabo Verde, no dia 1 de Setembro de 1970. Ali se manteve, ao longo de quase três anos, até Julho de 1973 desempenhando as mais diversas missões operacionais.

Assinale-se, como única excepção aos navios da classe, que o NRP «Quanza» foi o único dos dez navios-patrulhas «Cacine» a efectuar uma comissão na Guiné.

No dia 20 daquele mês largou com destino a Bissau, onde permaneceu no apoio a missões naquele teatro de guerra, quase exclusivamente na área costeira e bacias hidrográficas dos principais rios.

Em 14 de Outubro de 1974, dada por finda a comissão no Ultramar, regressou a Portugal continental, com escalas em Cabo Verde e na Madeira. Atracou na Base Naval de Lisboa em 2 de Novembro.

Entre 20.8.80 e 2.12.80 esteve no Arsenal do Alfeite, em fabricos e no estado de desarmamento, com lotação especial. Voltou ao estado de armamento e lotação normal em 30.10.81.

Desde o regresso do Ultramar que mantém actividade operacional na área costeira de Portugal continental e Ilhas no desempenho de múltiplas tarefas que lhe são atribuídas. Até 1985, desempenharam as funções de comandantes daquela unidade naval, dez oficiais, todos dos Quadros Permanentes e no posto de primeiro-tenente.

Até 1985 foram eles:

1TEN José Manuel Castanho Paes, 4.6.70 a 18.9.72
1TEN Aniceto Armando Pascoal, 18.9.72 a 27.9.73
1TEN José Manuel Garcia Mendes Cabeçadas, 27.9.73 a 19.12.74
1TEN António Alberto Rodrigues Cabral, 19.12.74 a 23.9.76
1TEN José Augusto de Brito, 23.9.76 a 27.11.78
1TEN Manuel Raul Ferreira Pires, 27.11.78 a 29.2.80
1TEN José Joaquim Peralta de Castro Centeno, 29.2.80 a 24.9.80
período no estado de desarmamento e com lotação reduzida, 24.9.80 a 9.11.81
1TEN Fernando Delfim Guimarães Tavares de Almeida, 9.11.81 a 28.7.83
1TEN Fernão Manuel Pacheco Malaquias Pereira, 28.7.83 a 18.9.85
1TEN José Domingos Pereira da Cunha, 18.9.85 a 5.10.85*

* Manteve o lugar de comandante até ser exonerado em 16.11.87



Até 1975 seis oficiais da Reserva Naval integraram a guarnição daquele navio-patrulha:

2TEN RN Carlos Alberto de Albuquerque Neves Costa, 15.º CFORN, desde 4.6.70
2TEN RN Vitor Correia Guimarães, 18.º CFORN, desde 31.10.71
2TEN RN António Manuel Mendonça Guerreiro, 22.º CFORN, desde 16.10.73
2TEN RN António Carlos de Queiroz Vilela Bouça, 24.º CFORN, desde 2.12.74
2TEN TE RN Lídio Marques Fernandes, 24.º CFORN, desde 3.9.75
2TEN TE RN António Manuel Ribeiro Araújo, 25.º CFORN, desde 4.9.75

A partir de 1975:

2TEN RN Armando Manuel Barreto Antunes, 32.º CFORN, desde (? 1980)

Tal como em todas as outras unidades navais da mesma classe, mais oficiais da Reserva Naval ali terão prestado serviço, entre 1975 e 1992, carecendo o tema de adequada pesquisa e recolha de informação. Pelo menos até 1992, ano em que foi "extinta" oficialmente a Reserva Naval ou, mais correctamente, quando foi considerado que os oficiais de RV e RC não disporiam, em condições normais de formação, conhecimentos suficientes para o desempenho de algumas das funções exigidas em unidades navais.

Atualmente, o NRP «Quanza» presta serviço nas Zonas Marítimas do Norte e da Madeira, tendo como principal missão o exercício da segurança e autoridade do Estado nas suas diversas vertentes.

Nestas missões, destacam-se a fiscalização da pesca, a salvaguarda da vida humana no mar, a fiscalização dos esquemas de separação de tráfego marítimo, o controlo da poluição e o apoio às populações e a organismos civis.



Fontes:
Texto do autor compilado a partir de Wikipédia em http://pt.wikipedia.org/, "Setenta e Cinco Anos No Mar, Navios-Patrulhas da Classe "Cacine", 10.º Vol, 1999, Comissão Cultural da Marinha; com a devida vénia, fotos do navio-patrulha “Cuanza” em http://www.marinha.pt e http://photobucket.com/images/NRP+Cuanza/; texto e foto do NM “Quanza” compilados a partir de “Paquetes Portugueses”, Luis Miguel Correia, Edições Inapa, 1992, em http://lmc-naviosportugueses.blogspot.com/


mls

2 comentários:

Luís Henriques disse...

Bonitas fotos. Apesar de nunca ter visto nenhum "ao vivo" acho estes navios da classe "Cacine" bastante estéticos. Fico triste por estarem a desaparecer. Contudo, fiquei bastante satisfeito com a notícia sobre a possibilidade de se preservar um como museu. Espero sinceramente que se venha a concretizar.

Cumprimentos,
Luís Henriques

Unknown disse...

Eu prestei serviço no NRP Quanza (era com esta grafia que se encontrava inscrita na fita do meu boné que eu guardo religiosamente) de Novembro de 79 a Novembro de 81. Gostaria de saber se alguém tem conhecimento do nome do pessoal da guarnição daquele tempo, é que já se passaram muitos anos e a memória desce na razão directa com a idade. Desde já obrigado. Ah servi com os Exmos 1º Ten Ferreira Pires, Castro Centeno e Imediato 2º Ten Sousa Machado. No período de desarmamento do navio era o Oficial Encarregado do Comando o saudoso 2º Ten Manuel José Fernandes