23 maio 2017

Histórias do DFE 13 (1) - Angola, 1965-1967


Angola-Destacamento de Fuzileiros Especiais n.º 13

(Post reformulado a partir de outro já publicado em 20 de Dezembro de 2009)




Vasco Quevedo Pessanha-7.º CEORN


Entrei em Outubro de 1964 para a Escola Naval, para o 7º CEORN como voluntário na classe de Fuzileiros. Depois da Escola Naval e do curso de fuzileiros navais em Vale de Zebro, integrei o curso de fuzileiros especiais que terminou em finais de Setembro ou início de Outubro de 65.

Desde miúdo e não sei porque razão, sempre tive uma espécie de fascínio por Angola. Eis senão quando, terminado o curso de FZE em Vale de Zebro tomo conhecimento de que estava prestes a embarcar para Angola o Destacamento nº 13 de Fuzileiros Especiais, DFE 13, cujo comandante era o 1º tenente António Pestana dos Santos (do quadro), que eu não conhecia senão de vista, da Escola de Fuzileiros e cujo imediato era o Vasco Lupi do quadro permanente e recém saído, quer da Escola Naval quer da Escola de Fuzileiros.

O “chamado” 3º oficial era o 2º tenente RN Ramos que, depois de dois anos na Escola de Fuzileiros, como instrutor, estava desesperado com a ideia de ir para Angola passar mais outros dois anos. Não foi difícil chegar a acordo com ele sobre a troca (eu iria como voluntário no seu lugar). Mais difícil seria convencer a hierarquia. Rapidamente apresentámos, em conjunto, uma petição ou um requerimento e ficámos à espera. Estávamos nos primeiros dias de Outubro.

O DFE 13 partia para Angola no dia 15 e cada um de nós, por razões diametralmente opostas, estava a ficar nervoso: um com a perspectiva de ir e o outro com a perspectiva de não ir. Por volta do dia 5 de Outubro, estava eu de oficial de serviço na Escola de Fuzileiros quando vem uma chamada para mim: o CEMA, Almirante Reboredo, também conhecido como o “Grande da espingarda” queria falar comigo com urgência. Nervosismo da minha parte, consternação dos colegas.

O que é que eu teria feito para o CEMA me chamar a mim, simples mortal, aspirante, FZE pintado de fresco? Apresentei-me no Terreiro do Paço. Passei à
sala de espera. Finalmente entrei no Gabinete do Almirante Reboredo onde fui submetido a cerrado inquérito e questionário sobre a minha vida pessoal, vida universitária, sobre a Escola Naval, Vale de Zebro, nível de instrução recebida, etc., etc., etc.

– E agora o que queres fazer? Pergunta o Almirante.

– Quero ir para Angola no Destacamento nº13 de Fuzileiros Especiais, respondi eu.

– Mas porquê? Tentei explicar-lhes as minhas razões e o meu interesse por Angola desde puto. – Isso vai ser muito difícil, diz o CEMA. Explico-lhe o meu arranjo com o Ramos. Eu sou voluntário para ir e ele é voluntário para ficar. Porque não? Quem perde com a troca?

– Vamos ver o que se arranja, acaba por fim por me dizer o CEMA. Mas ficas já a saber que não vejo as coisas fáceis. Isto de trocas é complicado e abre precedentes.

Dois ou três dias depois eu era nomeado e o Ramos dispensado. Tudo bem, só que tinha apenas 5 dias pela frente para conhecer melhor o Pestana e o Lupi e preparar tudo o que estava ligado a uma ausência de 1 ou 2 anos. A primeira coisa que o Pestana quis saber foi se eu jogava bridge. Disse-lhe que não sabia jogar bridge. Então o que é que você sabe fazer? Começou assim uma sólida e boa amizade que dura até hoje.

Saímos de Lisboa no Vera Cruz a 15 de Outubro, e assim começou para mim um período que foi extraordinário em todos os aspectos e que acabaria com o regresso ao Puto em Setembro de 1967.




Só anos mais tarde percebi porque fora aceite o meu pedido para integrar o DFE 13 em substituição do Ramos. O velho Almirante Reboredo era um amigo da minha família e tinha recebido 3 “cunhas”. A primeira em 64 para eu ser recusado pela Armada como voluntário para os fuzileiros. A segunda para ser recusado o meu pedido de integração no DFE 13. Ambas estas cunhas tinham sido veículadas pela minha família que via com horror a minha fantasia por este “safari” angolano. A terceira cunha tinha sido minha, era o meu próprio pedido para embarcar para Angola, confirmado directamente ao “Grande da espingarda” na entrevista que tive com ele.

Não sei se a decisão dele foi fácil mas julgo que o fraquinho que tinha como “Pai dos Fuzos” e a minha convicção e argumentação o convenceram. Afinal foi a minha própria cunha que funcionou! Da minha comissão tenho algumas histórias que para contar. Umas com piada, outras com interesse.

Nós, os portugueses, temos pouco o hábito de relatar e escrever aquilo por que passámos e que tantas vezes fazem parte das “pequenas histórias” e que outras tantas também influenciam, por vezes decisivamente, a grande História.

Vou tentar escrever umas coisas sobre o que vi e vivi nesse período em que tive a oportunidade de estar em postos no Zaire, em Cabinda, em algumas guerras na zona dos Dembos e no Leste de Angola, no Rio Lungue Dungo.

A primeira epístola será para o próximo número.


Vasco Quevedo Pessanha
FZE - 7º CEORN


Fontes:
Arquivo de Marinha; Anuário da Reserva Naval, Adelino Rodrigues da Costa e Manuel Pinto Machado, Lisboa, 1992; Dicionário de Navios e Efemérides, Adelino Rodrigues da Costa, 2006; Texto do autor do blogue compilado e corrigido a partir do publicado na Revista n.º 7 da AORN - Associação dos Oficiais da Reserva Naval, Jan/Mar 1998; Fotos de Arquivo do autor do blogue;

mls

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