29 maio 2017

Histórias do DFE 13 (II) - Angola, 1965-1967


Angola-Destacamento de Fuzileiros Especiais n.º 13

(Post reformulado a partir de outro já publicado em 23 de Dezembro de 2009)




Vasco Quevedo Pessanha-7.º CEORN


Embarquei no Vera Cruz com o DFE 13 no dia 15 de Outubro, rumo a Luanda, onde chegámos 10 ou 15 dias depois.

Durante a viagem o comandante do Destacamento - Pestana dos Santos - tinha já desistido de ensinar-me a jogar bridge, no qual ele próprio se aplicava com regularidade com colegas do exército que também iniciaram a sua comissão.

A viagem foi pacata, aprendemos todos a conhecermo-nos melhor (o Pestana, o Lupi e eu) e comecei a conhecer também os homens com quem iria conviver directamente nos próximos dois anos.
Chegados a Luanda ficámos instalados na Base Naval, situada na ilha de Luanda e de certo modo entregues aos cuidados do 1º tenente Melo e Cunha, Comandante do Destacamento que iríamos render e que, durante cerca de um mês, foi o homem responsável por um treino “in loco” da nossa unidade.

O 1º tenente Melo e Cunha pareceu-me, às primeiras impressões um homem saído dos livros que o Jean Larteguy escreveu sobre as guerras da Indochina e Algéria e que eu tinha lido todos: “Os Mercenários”, “Os Centuriões”, “Os Pretorianos”, etc. Alto, seco, atlético, voz rouca, experiência de mato, enfim um especialista da guerra de guerrilha com experiência adquirida e histórias já vividas. Com ele aprendemos umas quantas coisas que nos vieram a ser muito úteis na nossa comissão.

O sistema que o Comando Naval tinha adoptado para utilizar os fuzileiros especiais em Angola era, a meu ver, inteligente. Baseava -se no princípio da rotação permanente dos 3 grupos de combate, de 25 homens cada, em que os DFE’S, para efeitos operacionais, eram divididos.

Em 1965 estava atribuída aos Fuzileiros Especiais a defesa da fronteira fluvial do rio Zaire e parte da fronteira de Cabinda com o ex-Congo-Braza, além da participação em operações especiais, conjuntamente com o exército e os “Paras” na região dos Dembos.

No Zaire havia 5 postos na margem angolana a partir de Santo António do Zaire para montante: Quissama, Pedra do Feitiço, Puelo, Macala e Tridente, este último a uma distância de 15 minutos de bote de Noqui.

Em Cabinda havia um posto numa das extremidades da lagoa do Massabi, instalado numa antiga fazenda da CUF que estava ainda a cargo do Sr. Páscoa que tinha um chimpanzé simpático que dava pelo nome de Benfica.

Já em 1966, com a abertura da frente no Leste de Angola, os fuzileiros passaram a estar em regime de permanência também no rio Lunqué Bungo (200 kms. a SE de Vila Luso) e na Lumbala, na zona sul do Saliente do Cazombo, junto à fronteira com a Zambia.

Mas, como dizia, o princípio da rotação estava em vigor, quer isto dizer que após um período de cerca de 2 meses em que cada grupo de combate do destacamento ocupava um dos postos do Zaire, o destacamento voltava todo a Luanda onde passava a integrar as forças de intervenção que actuavam em operações especiais no Norte de Angola, conjuntamente com os comandos dos outros ramos da FA’s.

Depois de um período de 6 a 8 semanas voltávamos aos postos do Zaire e de Cabinda mas ocupando normalmente postos diferentes daqueles em que já tínhamos estado anteriormente. Mais dois meses e dava-se nova rendição na zona de Dembos.




Os tempos passados no Leste de Angola eram maiores que os períodos do Zaire ou Cabinda mas o princípio da rotação mantinha-se. Este regime de permanente mobilidade, além de permitir a minimização das neuras que afectavam muitíssimo os camaradas do exército, que chegavam a estar 18 a 24 meses no mesmo local, permitia uma actuação diferente, em zonas novas, introduzindo uma parte de novidade e de desconhecido em situações alternadas de dificuldade e perigo com outras de tranquilidade e descontracção, com os evidentes efeitos positivos no clima psicológico de todos os homens do destacamento.

Além disso esta situação permitiu também que viéssemos a conhecer regiões muito diferentes de Angola. Pela minha parte fiquei a conhecer o rio Zaire e as suas margens angolanas palmo a palmo, todo o território de Cabinda, variadissímas zonas do Norte de Angola, onde fizemos inúmeras operações de intervenção a partir de Luanda e ainda cerca de 700 kms do rio Lungué Bungo (afluente do Zambeze) desde a nascente perto da ex-Silva Porto até à fronteira da Zambia, além de toda a região compreendida entre a ex-Vila Luso e Gago Coutinho.

Também fiquei a conhecer uma boa parte do centro, do Sul e da costa entre Lobito e Luanda por ocasião de umas curtas férias que tive antes de regressar à Metrópole. Enfim, para quem sonhava com Angola desde miúdo não fiquei nada mal servido!

Ao que parece este esquema de utilização dos fuzileiros que esteve em vigor em Angola durante uma série de anos, foi alterado a partir de finais de 1967 tendo-se acabado com o tão salutar princípio da rotatividade a favor da presença muito prolongada (12 a 18 meses) nos mesmos locais com resultados que desconheço mas de cuja eficácia me permito ter as maiores dúvidas.

Um excelente sargento do meu destacamento, o sargento Trigo, que comigo estava a fazer a sua 2ª comissão, regressou em 68 ou 69 ao Lungué Bungo, em nova comissão, onde esteve o tempo suficiente para em actividade lateral e de part-time, se ter dedicado à pecuária.

Com efeito à chegada comprou no kimbo local 3 vacas e um boi e quando acabou a comissão, 24 meses depois, tinha já uma dúzia de cabeças de gado que eram pacatamente apascentadas nas chamas e margens do rio e que vendeu às populações locais por uns bons cobres no momento da partida. Julgo que foi com essas economias e outras que, à chegada à Metrópole montou um pequeno supermercado na Cruz de Pau ou por aí perto.

Para o sargento Trigo foi óptimo o fim da rotatividade mas quanto à eficácia da nossa acção militar tenho as mais sérias reservas.

Não sei se é a chamada “Lei de Murphy” que diz que se alguma coisa pode descambar, então descamba com certeza. Não me admira que tivesse sido essa uma das causas.

No período que estive em Angola vi tanto disparate e insensatez na forma como foi conduzida a nossa acção militar que este caso nem merece a pena ser referido.

Julguei que este meu segundo escrito seria para referir já episódios concretos, mas acabei por divagar sobre o enquadramento da nossa actuação.

Veremos o que sai para a próxima vez.


Vasco Quevedo Pessanha
FZE - 7º CEORN


Fontes:
Arquivo de Marinha; Anuário da Reserva Naval, Adelino Rodrigues da Costa e Manuel Pinto Machado, Lisboa, 1992; Dicionário de Navios e Efemérides, Adelino Rodrigues da Costa, 2006; Texto do autor do blogue compilado e corrigido a partir do publicado na Revista n.º 7 da AORN - Associação dos Oficiais da Reserva Naval, Abr/Set 1998; Fotos de Arquivo do autor do blogue;

mls

23 maio 2017

Histórias do DFE 13 (1) - Angola, 1965-1967


Angola-Destacamento de Fuzileiros Especiais n.º 13

(Post reformulado a partir de outro já publicado em 20 de Dezembro de 2009)




Vasco Quevedo Pessanha-7.º CEORN


Entrei em Outubro de 1964 para a Escola Naval, para o 7º CEORN como voluntário na classe de Fuzileiros. Depois da Escola Naval e do curso de fuzileiros navais em Vale de Zebro, integrei o curso de fuzileiros especiais que terminou em finais de Setembro ou início de Outubro de 65.

Desde miúdo e não sei porque razão, sempre tive uma espécie de fascínio por Angola. Eis senão quando, terminado o curso de FZE em Vale de Zebro tomo conhecimento de que estava prestes a embarcar para Angola o Destacamento nº 13 de Fuzileiros Especiais, DFE 13, cujo comandante era o 1º tenente António Pestana dos Santos (do quadro), que eu não conhecia senão de vista, da Escola de Fuzileiros e cujo imediato era o Vasco Lupi do quadro permanente e recém saído, quer da Escola Naval quer da Escola de Fuzileiros.

O “chamado” 3º oficial era o 2º tenente RN Ramos que, depois de dois anos na Escola de Fuzileiros, como instrutor, estava desesperado com a ideia de ir para Angola passar mais outros dois anos. Não foi difícil chegar a acordo com ele sobre a troca (eu iria como voluntário no seu lugar). Mais difícil seria convencer a hierarquia. Rapidamente apresentámos, em conjunto, uma petição ou um requerimento e ficámos à espera. Estávamos nos primeiros dias de Outubro.

O DFE 13 partia para Angola no dia 15 e cada um de nós, por razões diametralmente opostas, estava a ficar nervoso: um com a perspectiva de ir e o outro com a perspectiva de não ir. Por volta do dia 5 de Outubro, estava eu de oficial de serviço na Escola de Fuzileiros quando vem uma chamada para mim: o CEMA, Almirante Reboredo, também conhecido como o “Grande da espingarda” queria falar comigo com urgência. Nervosismo da minha parte, consternação dos colegas.

O que é que eu teria feito para o CEMA me chamar a mim, simples mortal, aspirante, FZE pintado de fresco? Apresentei-me no Terreiro do Paço. Passei à
sala de espera. Finalmente entrei no Gabinete do Almirante Reboredo onde fui submetido a cerrado inquérito e questionário sobre a minha vida pessoal, vida universitária, sobre a Escola Naval, Vale de Zebro, nível de instrução recebida, etc., etc., etc.

– E agora o que queres fazer? Pergunta o Almirante.

– Quero ir para Angola no Destacamento nº13 de Fuzileiros Especiais, respondi eu.

– Mas porquê? Tentei explicar-lhes as minhas razões e o meu interesse por Angola desde puto. – Isso vai ser muito difícil, diz o CEMA. Explico-lhe o meu arranjo com o Ramos. Eu sou voluntário para ir e ele é voluntário para ficar. Porque não? Quem perde com a troca?

– Vamos ver o que se arranja, acaba por fim por me dizer o CEMA. Mas ficas já a saber que não vejo as coisas fáceis. Isto de trocas é complicado e abre precedentes.

Dois ou três dias depois eu era nomeado e o Ramos dispensado. Tudo bem, só que tinha apenas 5 dias pela frente para conhecer melhor o Pestana e o Lupi e preparar tudo o que estava ligado a uma ausência de 1 ou 2 anos. A primeira coisa que o Pestana quis saber foi se eu jogava bridge. Disse-lhe que não sabia jogar bridge. Então o que é que você sabe fazer? Começou assim uma sólida e boa amizade que dura até hoje.

Saímos de Lisboa no Vera Cruz a 15 de Outubro, e assim começou para mim um período que foi extraordinário em todos os aspectos e que acabaria com o regresso ao Puto em Setembro de 1967.




Só anos mais tarde percebi porque fora aceite o meu pedido para integrar o DFE 13 em substituição do Ramos. O velho Almirante Reboredo era um amigo da minha família e tinha recebido 3 “cunhas”. A primeira em 64 para eu ser recusado pela Armada como voluntário para os fuzileiros. A segunda para ser recusado o meu pedido de integração no DFE 13. Ambas estas cunhas tinham sido veículadas pela minha família que via com horror a minha fantasia por este “safari” angolano. A terceira cunha tinha sido minha, era o meu próprio pedido para embarcar para Angola, confirmado directamente ao “Grande da espingarda” na entrevista que tive com ele.

Não sei se a decisão dele foi fácil mas julgo que o fraquinho que tinha como “Pai dos Fuzos” e a minha convicção e argumentação o convenceram. Afinal foi a minha própria cunha que funcionou! Da minha comissão tenho algumas histórias que para contar. Umas com piada, outras com interesse.

Nós, os portugueses, temos pouco o hábito de relatar e escrever aquilo por que passámos e que tantas vezes fazem parte das “pequenas histórias” e que outras tantas também influenciam, por vezes decisivamente, a grande História.

Vou tentar escrever umas coisas sobre o que vi e vivi nesse período em que tive a oportunidade de estar em postos no Zaire, em Cabinda, em algumas guerras na zona dos Dembos e no Leste de Angola, no Rio Lungue Dungo.

A primeira epístola será para o próximo número.


Vasco Quevedo Pessanha
FZE - 7º CEORN


Fontes:
Arquivo de Marinha; Anuário da Reserva Naval, Adelino Rodrigues da Costa e Manuel Pinto Machado, Lisboa, 1992; Dicionário de Navios e Efemérides, Adelino Rodrigues da Costa, 2006; Texto do autor do blogue compilado e corrigido a partir do publicado na Revista n.º 7 da AORN - Associação dos Oficiais da Reserva Naval, Jan/Mar 1998; Fotos de Arquivo do autor do blogue;

mls

21 maio 2017

Reserva Naval - Um Juramento de Bandeira...


…não é só uma cerimónia militar!

(Post reformulado a partir de outro já publicado em 12 de Dezembro de 2009)




Cerimónia militar junto à Porta de Armas da Escola de Fuzileiros


Pela madrugada ou ainda com a noite cerrada, em frente à Escola de Fuzileiros, concentra-se a multidão de familiares que vêm de todo o país, passando toda a noite em viagem, por vezes com grandes dificuldades. Todos eles querem ver o filho, o neto, o sobrinho ou, tão somente, um amigo que vai “jurar bandeira”. Muitos não sabem explicar porquê, mas querem estar presentes num momento que, por qualquer razão, acham que é importante.

À porta da Escola de Fuzileiros, eram ainda nove horas da manhã e faltavam duas horas para a cerimónia. As pessoas esperavam ansiosamente a hora em que poderiam entrar para assistir à festa. A avó, a mãe e a tia vinham de Aveiro e saíram de casa às três da manhã: a avó já tinha assistido ao "juramento" de outros netos mas continuava a querer vir. Não era a curiosidade que a atraía, era o sentimento de que o neto ultrapassava um “marco importante” da sua vida, e ela queria estar lá para vê-lo.




Formatura na Parada da Escola de Fuzileiros

Mães, avós, tias, irmãs, de uma forma geral, encaravam o acontecimento com muito mais gravidade ou solenidade do que os homens. Queriam ver o rapazito que criaram e mimaram, fardado, metido na formatura, com uma espingarda na mão e a dizer: “juro... defender a minha pátria...”. Queriam ver como ele se tinha transformado num homem.

Muito naturalmente que os pais também não são insensíveis a este significado oculto e quase mítico do juramento de bandeira, mas tratava-se da repetição do que eles próprios já tinham feito.O seu prazer era mostrar a naturalidade de quem conhece bem o que se vai passar, de quem já sabe mais qualquer coisa, realçando, por vezes, como esses tempos antigos eram mais duros. Naquele tempo é que era! - uma frase que todos os marinheiros conhecem muito bem.




1973, Escola Naval - Juramento de Bandeira do 21.º CFORN, todas as Classes

Agora, tudo é mais fácil! Inevitavelmente, no meio da multidão, aparecem caras conhecidas. Neste caso era um velho marujo, um Fuzileiro antigo que, para além de acompanhar uns amigos, vinha em peregrinação à Escola que o formou, que o viu partir para África mais do que uma vez e onde deu instrução. Para ele as coisas eram familiares mas, ao mesmo tempo, mais emotivas. Explicou que, no tempo dele - já lá vão umas dezenas de anos - quando foi às “inspecções” em Lamego, todos os jovens queriam ser apurados para a tropa.

Depois dessa primeira “prova” que assumia o carácter de uma escolha, os que ficavam inaptos chegavam a chorar, com o sentimento de que “não serviam”.

Agora, claro, o sentimento prático (ou vertiginoso) do mundo moderno, já não se compadece com estes complexos e a interrupção da corrida para a vida é o aspecto mais importante que os jovens vêem no cumprimento do serviço militar (sobretudo nos grandes núcleos metropolitanos).




1985 - Também na Escola Naval, o Juramento de Bandeira do 46.º CFORN da classe de Marinha

Mas vinham também alguns grupos de jovens, rapazes e raparigas, familiares ou amigos, que queriam estar presentes naquele momento.Tinham curiosidade porque nunca tinham visto uma cerimónia militar, vinham por solidariedade com o amigo que já tinha ido assistir ao “juramento” deles ou estavam à beira de ir cumprir o serviço militar e queriam ter um primeiro contacto com essa vida, para eles um pouco difusa ou misteriosa.

Cerca das nove e trinta, puderam entrar e ocupar o espaço circundante à parada, sem qualquer lugar sentado. Assim estiveram até ao meio dia e trinta, com a mesma satisfação com que entraram, entusiasmados para dizer adeus, bater palmas, piscar o olho, fazer qualquer sinal que mostrasse a sua presença ao militar que desfilava e que, certamente, também já os tinha visto no meio do público.

Dentro de alguns momentos, poderiam abraçar-se, falar, rir, mas aquela proximidade da formatura, que passava junto deles, era a antecâmara desse momento final em que as fardas se misturam com as saias ou blusas e com os fatos. Alguns minutos depois já era possível distinguir os bonés brancos dos jovens recrutas, recém-formados, no meio da massa de pessoas que enchia a Parada e que, a pouco e pouco, se ia encaminhando para a porta de armas.

Concluía-se uma das dimensões fundamentais daquilo que, a nós militares, frequentemente escapa nestas cerimónias: o delírio da festa, o epílogo feito da exteriorização da alegria, o momento em que, finalmente, é possível abraçar o ente querido que protagonizou todo o ritual. A ansiedade da espera à porta, a satisfação de o reconhecer na formatura, a apreensão na solenidade dos momentos mais significativos, o contacto fugaz de uma troca de olhares durante o desfile e, finalmente, o abraço que permite a partilha de todos estes sentimentos vividos, em crescendo, durante a manhã.

Formalmente, o jovem militar tinha assumido um compromisso com a Pátria, jurando defendê-la com o sacrifício da própria vida e simbolicamente, o rapazinho, saído de casa dos pais, era um homem. É uma aparente dualidade que só pode entender-se como tal se não nos lembrarmos do sentido exacto do que é o patriotismo ou se não conseguirmos ver no compromisso formal para com a Pátria, o compromisso com a terra dos pais.




Fuzileiro Uma Vez, Fuzileiro Para Sempre...



É isso que significa efectivamente e é isso que faz com que, dentro da sociedade em que está inserido, o jovem passe a pertencer a um novo grupo. Não é só o aluno recruta que passou a ser um militar pronto, é essencialmente, um novo português, adulto, com responsabilidades assumidas por si próprio. A dimensão das palavras, à custa de serem usadas repetidamente até à exaustão, pode perder-se ou alterar-se.

Neste caso, “jurar bandeira” é, naturalmente, uma cerimónia militar com um significado preciso como são precisos e concisos os significados formais das palavras “pátria” e “patriotismo”. Na sociedade civil, podem ser palavras desgastadas mas não são sentimentos em crise, ou as pessoas simples, os cidadãos comuns de toda a parte do país não teriam este tipo de comportamento, com a naturalidade com que o podemos testemunhar, sempre que ocorre um juramento de bandeira.


Carlos Alberto Pereira Pinto
2TEN FZ RN
1º CFORN FZ, 1989/1990
NII 76789


Nota: O 1º CFORN FZ 1989/1990 foi um Curso de Formação de Oficiais da Reserva Naval, da classe de Fuzileiros, realizado na Escola de Fuzileiros. 31 Cadetes foram incorporados em 30 de Agosto de 1989 e promovidos a Aspirante a Oficial em 3 de Fevereiro de 1990.

Fontes:
Pesquisa e compilação de textos do autor; fotos de arquivo da Revista da Armada, Escola de Fuzileiros e autor do blogue; Revista n.º 7 da AORN - Associação dos Oficiais da Reserva Naval, Abr/Set 1998;


mls

20 maio 2017

Junho de 1966 - Navio Hidrográfico «João de Lisboa»


A Reserva Naval no navio hidrográfico «João de Lisboa»

(Post reformulado a partir de outro já publicado em 15 de Novembro de 2009)


O navio hidrográfico «João de Lisboa», assim classificado em 4 de Março de 1961, foi uma reconversão do antigo aviso de 2ª classe com o mesmo nome.

Serviu na Missão Hidrográfica do Continente e Ilhas Adjacentes e foi abatido ao efectivo dos navios da Armada em 30 de Setembro de 1966.




Numa das muitas missões efectuadas escalou o Funchal e efectuou o registo fotográfico da guarnição, na tradicional foto de família que acima se insere, com a limitação de não poder ser legendada na totalidade pelo desconhecimento da maioria dos elementos que a integravam.





Em cima, da esquerda para a direita: STEN RN João da Rocha Camargo de Sousa Eiró - 6º CEORN, 1TEN Alves Sameiro, 1TEN Jorge Bastos - Oficial Imediato, CTEN Miranda Gomes, CMG Luciano Bastos - Sub-Director do Instituto Hidrográfico e Comodoro Ramalho Rosa - Director do Instituto Hidrográfico.

Em baixo, da esquerda para a direita: CTEN José Emilio Ataíde - Comandante, CTEN AN, n/identificado - Instituto Hidrográfico, 1TEN SG Ribeiro, 2TEN RM Gil Costa, 1TEN Mautempo, STEN MN RN Luciano Ravara - 6º CEORN e Asp RN Pedro José Araújo de Sousa Sousa Ribeiro do 7º CEORN.





Este navio veio a ser rendido, nas missões que desempenhava, pelo navio hidrográfico «Afonso de Albuquerque» que largou de Lisboa em 20 de Junho de 1966 com essa finalidade.


Fontes:
Dicionário de navios e Efemérides, Adelino Rodrigues da Costa, 2006; foto e texto cedidos pelo STEN RN Pedro José Araújo de Sousa Ribeiro;


mls

15 maio 2017

Rio Zaire - Meditações Acerca da Pedra do Feitiço


Angola, 1966 - Rio Zaire "Meditações Acerca da Pedra do Feitiço"

(Artigo escrito em 1997)



2TEN FZ RN Paulo Lowndes Marques
8.º CEORN - Curso Especial de Oficiais da Reserva Naval



Faz precisamente trinta e um anos que comandei o posto da Pedra do Feitiço, junto ao Rio Zaire. Contemplando o grande rio com a sua força (no tempo das chuvas um bote era levado pela corrente a 3,8 nós) muitas vezes meditei no enorme e épico esforço de Diogo Cão (que lhe chamou Rio Poderoso) e seus homens a subir a pulso este rio, verdadeiramente poderoso, até às cataratas de Ielala, a 81 milhas da foz, bem a montante de Noqui onde, no nosso tempo, o Rio Zaire deixava de ser fronteira internacional e penetrava naquilo que designávamos o Congo-Kinshasa.

Mobutu em 1966 já estava no poder! Mas naquela meditação heroico-épica, e inseridos na experiência militar que vivíamos, instintivamente dávamos como sendo um dado adquirido o facto, algo ilógico, que Portugal estava na Pedra do Feitiço desde o tempo de Diogo Cão! Ora, estudando com mais vagar e maturidade a história da região descobri, para meu grande espanto, que a grande Pedra do Feitiço só foi finalmente e definitivamente ocupada pelos Portugueses em Agosto de 1915, por uma coluna do Tenente Fernandes que ocupou os fortes da margem esquerda do rio.




Foz do rio Zaire

Em Janeiro de 1916, saiu outra coluna de Noqui, batendo centros rebeldes estacionados nesta margem esquerda, por caminhos que, num mapa moderno, não é possível assinalar. É pois extraordinário de reflectir que comandei “a Pedra”, em 1966, esta só se tornara verdadeiramente portuguesa em termos estáveis, militares e portanto 50 anos antes!

Aliás, a Pedra do Feitiço faz parte da grande saga que foi a afirmação territorial e política de Portugal na bacia do Zaire contra as ambições de outros países europeus nos finais do século XIX. É também curioso meditar que, no momento em que escrevo estas linhas, Mobutu acaba de abandonar Kinshasa e o novo chefe Kabila entrou na cidade. E o país que nós, Fuzileiros, contemplávamos do outro lado do rio internacional, jaz despedaçado e destruído, minado por desgoverno e corrupção, onde grassam várias guerras civis e onde novamente se chocam interesses internacionais combatidos “por procuração” por grupos locais.

Em termos de direito internacional, Portugal, só em 1885, assinou em Berlim uma Convenção com a Association Internacional du Congo reconhecendo os direitos das futuras possessões de Leopoldo II da Bélgica. Em termos práticos, Portugal abandonava as suas reclamações à margem direita do Rio Zaire.

Restava um enclave com contornos vagos (só estava delimitado a sul e a leste) que incluía Cabinda e Molambo. É o que hoje se designa por Cabinda e de onde a Cabinda Gulf Oil Company exporta petróleo (sendo as instalações americanas, ironicamente, protegidas até há bem pouco tempo, por cubanos!), é de longe a maior fonte de divisas fortes para o Governo de Luanda. Embora, em 1885 tenha sido assinada uma convenção, muito restava ainda por fazer, no sentido de fazer prevalecer os direitos então aceites.

Com efeito, o chamado “scramble” de África envolvera países como a Alemanha e a Bélgica, que, em termos históricos, pouca ou nenhuma presença em África tinham tido. A comunidade interchuvas nacional, reunida no Congresso de Berlim, aceitara aquilo que denominou de doutrina da ocupação efectiva, contrapondo esta tese aos argumentos históricos, sobretudo de Portugal. Portugal estivera em muitos pontos - Diogo Cão na Pedra do Feitiço, por exemplo - mas pontualmente, esporadicamente.

Era muito difícil para um pequeno país pobre, desorganizado e geralmente envolvido em outros problemas considerados, na altura, bem mais importantes, empenhar-se numa presença efectiva em África. Por vezes construira Fortes mas também muitas vezes, e por diversas razões, os abandonara. Ali jaziam velhas ruínas que atestavam a nossa presença histórica, mas também o nosso abandono. “Os argumentos arqueológicos portugueses” como se referia Lord Salisbury, Primeiro Ministro Britânico.




Patrulha de Fuzileiros na zona de Quissanga

Foi esta nossa incapacidade perante as grandes potências, que culminou no Ultimato de 1890 e na humilhação nacional que esse incidente nos trouxe, e que tão profundamente marcou uma geração e as instituições políticas na altura.

Mas, voltando ao Rio Zaire, em 1879, as margens deste rio eram uma espécie de “no-man’s land” político. Havia presença comercial portuguesa em ambas as margens, quando o português era a língua fraca. Vários portugueses estavam comercialmente estabelecidos em Boma e Banana, por exemplo políticos, que em 1966 eram pequenas cidades congolesas. Muitas vezes, ao Domingo de manhã, aproximávamo-nos de Boma apartir da Pedra do Feitiço, para ver umas escassas europeias a banharem-se no rio. Tais proximidades irritavam as autoridades locais que as consideravam provocatórias. Recordo-me que recebi ordens expressas para não o fazer.

Tendíamos a ser, no fim do século, uma espécie de intermediários entre o subdesenvolvimento africano e a Europa industrial. Contudo, estas feitorias pagavam direitos costumeiros aos chefes locais. Sobretudo na costa norte, vários outros países tinham enclaves comerciais (como os franceses) e cada um arvorava a bandeira que entendia. Ameaçando os nossos direitos, também havia missionários católicos (franceses) e baptistas (ingleses).

A partir de 1880 começa a corrida aos tratados na parte do Baixo Rio Zaire. É assim que o francês Brazza, agindo para a França, assegura com o tratado Makoko, o domínio francês de Pont Noire e o futuro Congo Francês, hoje Congo-Brazzaville, onde nós tínhamos uma forte presença comercial. O tratado causou viva indignação entre nós. Em 1883, a marinha francesa desembarca em Noire onde encontra forte resistência (os Africanos apreciavam-nos mais!).

Em 1884, há uma intervenção por parte de duas canhoneiras nossas na margem norte do Zaire contra os Solangos (perto de Porto de Lenha, entre Boma e Banana) que tinham atacado feitorias portuguesas. Em Fevereiro de 1884, assinou-se um tratado anglo-português, o chamado Tratado do Zaire, que nos permite ocupar as duas margens do rio até Noqui (houvera concessões em Moçambique). Contudo, este Tratado suscitou a oposição de Leopoldo II, de Bismarck e ainda da França. Assim, e sobretudo devido à Alemanha, este tratado é denunciado pela Inglaterra em Junho do mesmo ano.

Recordamos que a presença Belga, na altura, fazia-se através de uma empresa privada cujo proprietário era o Rei Leopoldo II. Só mais tarde (1908) é que a comunidade internacional, movida pelos relatórios de brutalidades para com os nativos, obrigou o estado belga a adquirir a responsabilidade soberana por aquilo que então se passaria a chamar o Congo Belga. Os representantes do Rei Belga tentaram, em 1884, adquirir direitos de soberania sobre Boma.

Ferreira do Amaral, Governador Geral de Angola, envia três navios sob o comando de Brito Capelo. Capelo assina uma convenção com as autoridades gentílicas locais. Nos começos de 1885, concluem-se tratados com os sobas de Banana, Boma e de Santo António do Zaire. Mas foi sol de pouca dura e não houve continuidade de presença militar.




Instalações Navais de Sto António do Zaire

Finalmente reconhecemos o inevitável e um acordo entre Portugal e a Association International du Congo, atrás referida, foi assinado em Berlim, em 14 de Fevereiro de 1885. Portugal renunciava à margem direita do Zaire e Ambriz reconhecidos internacionalmente. Ainda houve problemas com os britânicos em Santo António do Zaire, mas esta fronteira estava consolidada quanto à comunidade internacional. Não o estava quanto às populações locais.

No começo deste século há constantes “guerrazinhas” com os Solangos na margem sul e interior. Assim, há expedições militares repressivas nesta área em 1900, 1901 (houve duas neste ano), 1902, 1908 e 1910.

Em 1913 dá-se uma grande revolta na zona do antigo reino do Congo (S. Salvador) motivada pelos abusos de recrutamento forçado para as roças de São Tomé. Os Solangos, em Outubro desse ano, recusam na Pedra do Feitiço o angariamento e, em Novembro, atacam o posto de Sumba e de Quifuma. Norton de Matos suspende o recrutamento para São Tomé em 1914. Sumba é reocupada nesse mesmo ano, mas pouco tempo depois novamente perdida como foi Quissanga e a Pedra do Feitiço.

Na margem esquerda só Noqui e Mossuco não foram invadidas, pois ali, uma canhoneira bombardeou os insurrectos. A repressão e reocupação processam-se lentamente. Começa em Janeiro de 1915 e só em Agosto é que o Tenente Fernandes reocupa a Pedra do Feitiço. Só em 1916 estava a zona da margem esquerda do Rio Zaire pacificada.

A guerra regressaria em força em 1961, quarenta e cinco anos depois.


Paulo Lowndes Marques
8ª CEORN





8.º CEORN - "In Memoriam" - Paulo Lowndes Marques

(Post reformulado a partir de outro já publicado em 2 de Janeiro de 2011)




Escola Naval, 20020218 - Paulo Lowndes Marques assina o Livro de Honra
no decorrer de um encontro entre elementos do 8.º CEORN - Curso Especial de Oficiais da Reserva Naval
a convite do Comando daquela Instituição



Faleceu num Sábado a 1 de Janeiro de 2011, Paulo Henrique Lowndes Marques do 8.º CEORN - Cursos Especial de Oficiais da Reserva Naval.

Ingressou na Escola Naval em 9 de Outubro de 1965 e foi promovido a oficial em 29 de Abril de 1966. Integrado na Companhia de Fuzileiros n.º 10 destacou para Angola onde, durante dois anos, cumpriu diversas missões ao serviço da Marinha de Guerra Portuguesa.

Licenciado em direito, Paulo Lowndes Marques foi, juntamente com Diogo Freitas do Amaral, fundador do CDS e ambos eram amigos próximos de Adelino Amaro da Costa. Paulo Lowndes Marques faleceu aos 69 anos e, segundo Diogo Freitas do Amaral, "morreu de pé", numa referência aos compromissos que cumpriu até ao último momento.

Diogo Freitas do Amaral destaca a grande cultura e conhecimento da história e diplomacia que Paulo Lowndes Marques tinha. «Nunca quis altos cargos partidários», disse, sublinhando que foi «o principal representante» do CDS nas relações internacionais do partido.

Paulo Lowndes Marques foi secretário de Estado dos Negócios Estrangeiros num dos governos de Pinto Balsemão quando Vasco Futscher era Ministro dos Negócios Estrangeiros. Enquanto Freitas do Amaral foi presidente da União Europeia das Democracias Cristãs, em Bruxelas, Paulo Lowndes Marques foi secretário geral adjunto, entre 1981 e 1983.

Todos eles foram Oficiais da Reserva Naval da Marinha de Guerra sendo que, enquanto Paulo Lowndes Marques pertenceu ao 8.º CEORN (1965), Diogo Pinto de Freitas do Amaral e Adelino Manuel Lopes Amaro da Costa pertenceram ambos à classe de Técnicos Especialistas do 11.º CFORN (1967).

Paulo Lowndes Marques morreu vítima de doença prolongada. Em tempo, apresentámos sentidas condolências à família enlutada.

RIP Camarada!


Manuel Lema Santos
8.º CEORN


Fontes:
Texto e fotos do autor do blogue compilados com extractos do jornal «O Público», com a devida vénia; texto do artigo sobre o Zaire de Paulo Lowndes Marques publicado na revista da AORN n.º 4, Ano II, Abril/Junho 1997;


mls

09 maio 2017

Educação Física na Armada - Reserva Naval


Reserva Naval e Educação Física na Armada





Na Marinha, pelo Centro de Educação Física da Armada (CEFA) e por quase todas as Unidades em terra, passaram muitos Oficiais da Reserva Naval, nomeadamente professores de Educação Física, alguns deles com protagonismo actual na vida desportiva, académica e social.

Muitos outros ingressaram nos Quadros Permanentes e constituiam, à data, a quase totalidade dos Oficiais no activo que estavam à frente dos Serviços que ministravam esta disciplina nas diferentes Unidades em terra. Não é pois, despropositado, mas da elementar justiça, afirmar que a concepção e organização da Educação Física na Marinha era então fundamentalmente fruto do investimento de muitos profissionais oriundos da Reserva Naval.
A participação de todos os elementos trouxe benefícios para a causa da Educação Física na Marinha.

Para corroborar esta ideia, é oportuno referir que a razão pela qual não foram conhecidos acidentes por excessos que algumas vezes temos ouvido falar em outros ramos das Forças Armadas, pode ter ficado a dever-se a três aspectos conjugados:

– À abertura que a Marinha teve aos conhecimentos emanados de Instituições exteriores no que concerne à formação em Educação Física, estabelecendo protocolos com o antigo Instituto Nacional de Educação Física-INEF, posteriormente Instituto Superior e, actualmente, como Faculdade de Motricidade Humana, para a especialização de Oficiais.

– À organização interna da instrução por "departamentos", cabendo a cada um, uma instrução específica ministrada por “especialistas”.

– À solidez da formação dos especializados em Educação Física - Oficiais e Monitores - que, sem retirar a "dureza" que o treino físico militar tinham de possuir, possibilitava uma leitura atempada dos limites fisiológicos ao esforço.

Todavia a Educação Física na Marinha não se esgota na preparação física militar: a conquista social dos tempos livres e a regulamentação do trabalho, com restrições cada vez maiores para o exercício de uma profissão pelos jovens são por um lado uma forma de protecção à criança e por outro um meio de defesa dos trabalhadores.

Todavia, se o aumento de tempo livre pode contribuir para melhorar a qualidade de vida dos cidadãos, paradoxalmente, tem também efeitos preversos: nas escolas o que preocupa os pais e professores é o que fazem os jovens quando não estão nas aulas!

Paralelamente, face à conjugação de vários factores, o número de reformados tem aumentado relativamente à população activa, assim como existe uma ten-dência para que a reforma seja alcançada mais cedo. Este facto também veio colocar novos problemas! Georges Friedman (1972), na sua obra «O PODER E A SABEDORIA» refere-se aos reformados da seguinte forma: "Os problemas do homem depois do trabalho, são muitas vezes comparáveis aos do homem privado do trabalho" porque "na civilização técnica o emprego, mesmo enfadonho, define o homem, dá-lhe uma razão para ser social". Contudo, actualmente, deixámos de exortar o trabalho como um meio redentor e de aprimoramento do carácter.

Assim, o desporto e as actividades físico-desportivas, entendidas como aquelas que são orientadas para o culto do corpo e da sua funcionalidade, ganharam um lugar de destaque, quer atribuindo-se-lhes algumas virtudes que antes eram atributos do trabalho, quer pelo facto de constituirem uma ocupação capaz de combater comportamentos desviantes.

São estas as principais razões que levam todas as instituições, Escolas, Clubes, Municípios, etc., a investirem no desporto e em outras actividades de lazer, mobilizando milhares de cidadãos e contribuindo para que estas actividades tenham passado de um período onde tinham pouca expressão como actividade organizada, para um período em que passaram a ser consideradas com um serviço social de oferta obrigatória.

Neste quadro, não é de estranhar que a Marinha tenha sido permeável à influência da sociedade, nomeadamente através dos que nela cumpriram o Serviço Militar Obrigatório, e apoiasse a actividade física utilizando-a, não só como um meio de preparação militar, mas também como de inserção cultural dos militares e seus familiares.

Assim, o CEFA pela sua acção ao longo da estruturação da Educação Física na Marinha foi uma referência obrigatória, particularmente por dois motivos:

O primeiro teve a ver com a formação de Monitores que ministravam as aulas de Educação Física nas diferentes Unidades onde estavam colocados. Estes Monitores eram sujeitos a uma formação de um ano lectivo, estando creditados por algumas Federações, através dum protocolo, como agentes de ensino desportivo. Tinham sido realizados até então trinta e cinco Cursos, tendo sido alguns deles frequentados por Oficiais, Sargentos e Praças da Marinha, Força Aérea e Polícia de Segurança Pública.Também a Guarda Fiscal e a Guarda Nacional Republicana que enviaram elementos seus para frequentarem aquele Curso.

O segundo diz respeito à dinamização, organização e apoio a diferentes actividades, quer para os militares, quer para os seus familiares. Hoje em dia, apesar de haver sinais de alguma incompreensão e falta de sensibilidade para a importância da Educação Física como contributo para a saúde e bem-estar das populações, ela está estruturada de maneira a possibilitar a sua prática por toda a população militar.

Existem mais testes para avaliar a condição física como meio de garantir a operacionalidade do pessoal, mas também de estimular a sua participação nas actividades. Uma outra preocupação era garantir a todos um conjunto de competências no meio aquático, estes usualmente designadas com «saber nadar», através da despistagem dos que estão inadaptados e conduzindo-os à frequência de um «curso de adaptação ao meio aquático», com uma duração de vinte e quatro aulas. Existia ainda outro curso, com doze aulas, para os que estavam insuficientemente adaptados.

A avaliação do «saber nadar» era realizada através dum conjunto de «níveis de adaptação ao meio aquático», possibilitando determinar como e quanto cada um «sabia nadar». Estas e outras medidas contribuiram para que as actividades físicas conquistassem no dia-a-dia expressão como prática assumida com reflexos na saúde e bem-estar e constituam uma cultura específica, que usualmente se denominava como cultura física, com inegáveis repercussões sociais.

Como nota final, é oportuno salientar que as instituições reflectiam a obra daqueles que nelas trabalhavam e anteriormente tinham trabalhado. Num momento em que as Forças Armadas estavam sujeitas a uma redução do serviço militar obrigatório, este pequeno artigo de opinião deve ser entendido como um meio de lembrar os benefícios alcançados pela abertura e permeabilidade a valores sociais transpostos para dentro da instituição militar, sem a desvirtuar, mas antes enriquecendo-a, através do contributo de elementos que a integraram num determinado período da sua vida.

Com certeza que outros grupos profissionais deixaram a sua marca nesta instituição que a todos nós marcou.


Manuel Cantarino de Carvalho
9º CFORN


Fontes:
Revista n.º 3 da AORN-Associação dos Oficiais da Reserva Naval, Ano II, Janeiro/Março 1997; foto de «Faculdade de Motricidade Humana»;

mls

05 maio 2017

Ainda a Reserva Naval na Escola Naval, 1996


26 de Outubro de 1996




Mesa da Assembleia Geral




Rodrigues Maximiano, Presidente da Direcção da AORN, entrega a serigrafia da AORN ao Almirante Comandante da Escola Naval




"...marchando ao som de música para o refeitório"






Andrade Neves do 1º CEORN, Abel de Oliveira do 5º CEORN, Manuel Assunção do 5º CEORN e
Marques Antunes do 3º CEORN


Fontes:
Revista n.º 3 da AORN-Associação dos Oficiais da Reserva Naval, Ano II, Janeiro/Março 1997;

mls

03 maio 2017

Escola Naval e Reserva Naval, 1996



Extracto da comunicação do Almirante Castanho Paes, Comandante da Escola Naval

aquando da Assembleia Geral da AORN-Associação dos Oficiais da Reserva Naval, 26 de Outubro de 1996






"... não queria deixar de, em nome da Escola Naval, vos dar formalmente as boas-vindas a esta vossa casa, cujas raízes centenárias nunca é demais lembrar..."

"... E digo vossa casa, porque foi efectivamente aqui que a grande maioria de vós recebeu a formação militar naval básica e uma parte da formação técnico-naval necessárias ao desempenho das funções que lhes foram cometidas ao longo do período em que, servindo a Marinha, serviram o País..."

"... Julgo que a Marinha, de uma forma geral, sempre teve a consciência do valor do vosso contributo para a sua missão. A bordo ou em terra, em Portugal continental ou insular ou no antigo Ultramar, nos organismos técnicos ou nos fuzileiros, no Estado-Maior ou nos gabinetes dos vários comandos, direcções e chefias da Armada, quase 4.000 oficiais da Reserva Naval dedicaram uma parte da sua vida à nossa briosa corporação, pondo generosamente ao seu serviço as capacidades que cada um tinha em função da sua área e nível de formação académica..."

"... A Marinha deve-lhes pois uma significativa quota parte dos últimos 40 anos da sua História..."

"... Contudo, julgo que será também justo realçar que a Marinha vos terá dado alguma coisa em troca: provavelmente uma experiência humana de certo modo útil para as vossas carreiras profissionais, possivelmente um sentido de camaradagem pouco conhecido no meio civil, talvez até uma maior consciencialização sobre certos valores morais e sociais que integram os códigos de honra das instituições militares..."


Fontes:
Revista n.º 3 da AORN-Associação dos Oficiais da Reserva Naval, Ano II, Janeiro/Março 1997;

mls